Anselmo encontrava-se a fazer trabalhos na sua quinta com o trator emprestado de Samuel. Após terminar, estacionou o referido trator, desligando-o e travando-o com o travão de mão. Sucede que, momentos depois o trator veio desgovernado e colheu Anselmo, tendo-lhe causado ferimentos graves e vinte dias de internamento hospitalar. Anselmo pretende acionar o seguro de responsabilidade civil que Samuel tem sobre o trator para se ver ressarcido pelos danos sofridos. Será que o pode fazer?
Contrato de Comodato:
No caso apresentado, o trator foi emprestado a Anselmo para que este o utilizasse em trabalhos na sua quinta, ou seja, o trator estava a ser utilizado por Anselmo em seu próprio benefício.
Estamos perante a figura jurídica do contrato de comodato, o qual consiste num “contrato gratuito através do qual uma pessoa entrega à outra um bem, móvel ou imóvel, para que se sirva dele, com a obrigação de o restituir”, conforme o art.º 1129.º do Código Civil (doravante C.C.).
No momento do sinistro, Anselmo era, por isso, comodatário do trator. No âmbito de um contrato de comodato, o comodatário utiliza, neste caso, o trator em proveito próprio e determinando ele próprio a forma como utiliza o trator.
Contrato de Seguro de Responsabilidade Civil – Poderá ser acionado por Anselmo?
Samuel celebrou um contrato de seguro de responsabilidade civil que cobre os danos resultantes da utilização do trator, tendo em vista cobrir o risco de constituição, no seu património, de uma obrigação de indemnizar terceiros,
O artigo 137.º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16.04, determina que o proprietário do trator tem obrigatoriamente que celebrar um contrato de seguro de responsabilidade civil,
Por sua vez, o artigo 11.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.08, que aprovou o Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, estabelece que o seguro de responsabilidade civil previsto no artigo 4º. desse mesmo decreto lei, abrange, relativamente aos “acidentes ocorridos no território de Portugal, a obrigação de indemnizar estabelecida na lei civil”. Trata-se, por isso, de um seguro de responsabilidade e não de danos.
Na análise da situação exposta, importa ter em consideração o disposto no artigo 15.º, n.º 1, do Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, segundo o qual o contrato “garante a responsabilidade civil do tomador do seguro, dos sujeitos da obrigação de segurar previstos no artigo 4.º e dos legítimos detentores e condutores do veículo”.
Atenta à situação aqui em análise, no momento em que o acidente ocorreu, Anselmo era um legítimo detentor e condutor do trator. Logo, se ele tivesse incorrido em responsabilidade civil perante terceiros, esta seria garantida pelo contrato de seguro.
No que respeita a danos sofridos pelo próprio condutor, determina o artigo 14.º do Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, algumas exclusões, designadamente, os danos:
– corporais sofridos pelo condutor do veículo seguro responsável pelo acidente, assim como os danos decorrentes daqueles;
– materiais causados, nomeadamente, ao cônjuge e aos descendentes do condutor.
Atento ao exposto, os danos que Anselmo quer ver ressarcidos estão excluídos da garantia do seguro pelo artigo 14.º, n.º 1, do Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel.
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