Habeas Corpus, que pode ser traduzido como “que tenhas um corpo”, é um termo latino que frequentemente se ouve na comunicação social. Mas afinal, sabe a que é que se refere? Numa altura de Estado de Emergência, é importante estar a par dos seus Direitos mais do que nunca!
O que é o Habeas Corpus?
O artigo 8.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que “Toda a pessoa tem direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei.” Nesse sentido e considerando esse direito humano, a Constituição da República Portuguesa (CRP) estabelece, no número 1 do artigo 31.º que “haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.”
A Constituição refere ainda neste mesmo artigo 31.º duas outras coisas importantes. A primeira, plasmada no número 2 do artigo 31.º da CRP, é a de que esta providência poderá ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos. A segunda, referida no número 3 do artigo 31.º da CRP, é que o juiz decide sobre o pedido de Habeas Corpus no prazo de oito dias numa audiência que tem de ser contraditória.
Assim, podemos afirmar que o Habeas Corpus se traduz numa providência judicial, extremamente urgente, destinada a conceder liberdade a uma pessoa que foi ilegalmente privada dela. Qualquer privação da liberdade individual de cada um e contra a sua própria vontade, exercido por uma autoridade do Estado, que remeta um cidadão a um local delimitado, é fundamento bastante e suficiente para que se tome mão da providência de Habeas Corpus.
O Habeas Corpus em virtude de detenção ilegal
Estabelece o número 1 do artigo 220.º do Código de Processo Penal que, “os detidos à ordem de qualquer autoridade podem requerer ao juiz de instrução da área onde se encontrarem que ordene a sua imediata apresentação judicial, com algum dos seguintes fundamentos:
a) Estar excedido o prazo para entrega ao poder judicial;
b) Manter-se a detenção fora dos locais legalmente permitidos;
c) Ter sido a detenção efetuada ou ordenada por entidade incompetente;
d) Ser a detenção motivada por facto pelo qual a lei a não permite.”
Assim, a Lei estabelece quatro fundamentos concretos que permitem a que um cidadão detido ou qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, apresente requerimento de Habeas Corpus. Por exemplo, imagine que um cidadão se encontra detido nas masmorras de uma qualquer local deste antigo Portugal. Não sendo um local legalmente permitido (não é um estabelecimento prisional ou de órgão de polícia criminal), o cidadão em questão podia apresentar a providência em questão junto do Juiz de Instrução Criminal da área onde o detido se encontre.
Se o detido, conforme refere o número 3 do artigo 220.º do Código de Processo Penal, referir à autoridade que o tem detido, que pretende exercer o seu direito à apresentação de Habeas Corpus e esta obstaculizar, de alguma forma, essa apresentação, estaremos perante uma situação de abuso de poder, sendo de aplicar o artigo 382.º do Código Penal onde se estabelece que “o funcionário que, fora dos casos previstos nos artigos anteriores, abusar de poderes ou violar deveres inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.”
As mais das vezes, a detenção ilegal tem por base uma situação de privação total, precária e condicional da liberdade do cidadão que não resulte de uma decisão judicial e que, muito provavelmente, se encontra entre o momento da captura do cidadão e o despacho judicial que procede à apreciação e validação do ato e à aplicação da prisão preventiva.
O Habeas Corpus em virtude de Prisão Ilegal
Por seu turno, a providência de Habeas Corpus resultante de prisão ilegal, estabelecida no número 1 do artigo 222.º do Código de Processo Penal, pode ser apresentada por qualquer pessoa que se encontre ilegalmente presa perante o Supremo Tribunal de Justiça. No entanto, tem óbvias diferenças relativamente à providência de Habeas Corpus em virtude de detenção ilegal.
Desde logo, a petição é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremos Tribunal de Justiça e é apresentada perante a autoridade à ordem da qual o cidadão se encontra preso.
Depois, a petição de Habeas Corpus deve ter por base o facto de a prisão ser ilegal por:
“a) Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente;
b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou
c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.”
A prisão ilegal tem por base uma situação de privação da liberdade que foi judicialmente controlada e apreciada, daí que o procedimento de Habeas Corpus por prisão ilegal seja diferente relativamente ao relativo à detenção ilegal.