O tema da servidão de vistas é pouco falado, mas muito comum. As relações de vizinhança nem sempre são as melhores e, não raras vezes, deparamo-nos com o conflito entre vizinhos porque um dele decidiu proceder à abertura de janelas ou varandas em pleno incumprimento com o disposto no artigo 1360º do Código Civil que dispõe o seguinte:
“Artigo 1360.º
(Abertura de janelas, portas, varandas e obras semelhantes)
- O proprietário que no seu prédio levantar edifício ou outra construção não pode abrir nela janelas ou portas que deitem directamente sobre o prédio vizinho sem deixar entre este e cada uma das obras o intervalo de metro e meio.
- Igual restrição é aplicável às varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, quando sejam servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a sua extensão ou parte dela.
- Se os dois prédios forem oblíquos entre si, a distância de metro e meio conta-se perpendicularmente do prédio para onde deitam as vistas até à construção ou edifício novamente levantado; mas, se a obliquidade for além de quarenta e cinco graus, não tem aplicação a restrição imposta ao proprietário.”
Sucede que, nos termos do artigo 1362º do Código Civil, resulta que, mesmo que tenha sido construída “janela, porta, varanda, terraço eirado ou obra semelhante” em violação da lei, a existência de tais construções pode conduzir à aquisição por usucapião de servidão de vistas, e, se constituída, nascem para o dono do prédio vizinho restrições quanto a edifício ou outra construção que levante no seu prédio.
Ou seja, é necessário provar que a construção da “janela, porta, varanda, terraço eirado ou obra semelhante” ocorreu há mais de 20 anos, de forma pacífica e sem oposição.
Denote-se que, conforme doutamente decidido em Acórdão do STJ de 14-07-2016:
“É que não basta a existência de um espaço de onde se possa olhar para o prédio contíguo: o que a lei pretende é evitar a intromissão abusiva, o devassamento, e que objectos possam ser atirados para o prédio vizinho.
Existindo devassamento ou possibilidade dele, há intromissão ilegítima na reserva privada do vizinho, que é propiciada pela existência, nas obras elencadas no nº2 do art. 1360º do Código Civil (varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes), de parapeitos pois estes emprestam comodidade e segurança, permitindo que alguém se debruce e apoie os braços (normalmente os parapeitos das varandas e das janelas têm a altura de uma pessoa adulta de estatura normal) e, assim, possa devassar “comodamente” pela vista o que se passa no prédio contíguo.
(…) “não se exerce a servidão com o facto de se desfrutarem as vistas sobre o prédio, mas mantendo-se a obra em condições de se poder ver e devassar o prédio vizinho.”
Em regra, são situações de construções de muros que impedem a entrada de luz nas janelas ou varandas do prédio confinante que levam aos litígios judiciais sobre esta temática, sendo certo que é requisito essencial provar a existência de “janela, porta, varanda, terraço eirado ou obra semelhante” há mais de vinte anos de forma pacífica e sem oposição para que seja constituída a servidão de vistas, por usucapião.
Denote-se que o exemplo mencionado supra foi dado em traços gerais e sem enquadramento de pormenores que existem numa situação real e que podem ser decisivos para que haja uma decisão diferente da supra mencionada.
Obrigada por estás orientações. Mas poderia pedir uma opinião, comprei casa ah menos de um ano, os meus vizinhos tinham um garagem com lona, ferros e chapas mas não me incomodava. Neste momento estão a demolir para construção de uma nova garagem. O problema é que todas as minhas janelas estão viradas para o pátio, entrada da casa térrea. A garagem nova vai ter uma altura enorme, da altura da minha casa, tapando as janelas onde nem o Sol vai dar mais pois eles vão recuar 3 metros. Ou seja vai desde a entrada de minha casa, até á porta de casa. Tudo vai ficar tapado por um muro gigante. Na minha descrição da casa segundo a Gaia Urb, temos um muro meeira, a separar os dois terrenos. Em conversa dissemos que se ficasse como está tudo bem, mas vir para trás e bloquear a luz de todas as janelas incluindo entrada da casa não era justo. O que podemos fazer?. A obra está a todo gás
Fala pessoal, tudo bem?
Como na prática se dá o usucapião da servidão de vista? É possível dar um exemplo prático, uma situação concreta?
Pergunto pois não consigo imaginar o que poderia ser feito a fim de recuperar a vista após, por exemplo, a construção de um prédio de 20 andares entre uma casa que gozava de vista para o mar há 20 anos e passou a ter bloqueada integralmente a vista.
Grato pelo apoio desde já. Abs!
Esta situação poderá ser válida entre duas fracções do mesmo prédio que estejam em propriedade horizontal?